O movimento cristão Legendários ganha a cada dia seguidores em toda América Latina. No Brasil, a iniciativa começou em Balneário Camboriú no ano de 2017. No entanto, o projeto iniciou em 2015 na Guatemala pelo pastor Chepe Putzu.
O Legendários, movimento exclusivo para homens, busca “desenvolver o herói de cada família”, incentivando que os participantes se tornem líderes espirituais e morais nos lares e na comunidade. O objetivo é transformar a vida dos homens e incentivar que os participantes encontrem a melhor versão de si.
De acordo com o Ricardo Bernardes, representante do movimento em Balneário Camboriú, participam desse evento homens de 18 a 85 anos. Segundo ele, o movimento funciona com desafios de quatro dias. “Eles vão à montanha e passam por atividades que visam encontrar o seu propósito. Tudo baseado na bíblia”, explicou Bernardes.
Em Balneário Camboriú, mais de 9 mil homens já passaram pelo movimento, sendo o lugar que mais formou legendários no Brasil.
Apesar de ser um movimento que tem como objetivo despertar o melhor dos participantes, o Legendários é alvo de críticas na internet. A advogada e influencer Lauany Schultz publicou um vídeo em suas redes sociais falando sobre o movimento.
No vídeo, ela conta os valores de cada evento, que varia de acordo com o lugar. Ela também opina que com a vulnerabilidade dos homens após dias cansativos na montanha, eles absorvem as mensagens repassadas e acreditam que suas vidas tenham sido transformadas.
“Ninguém sabe ao certo o que acontece por lá, mas considerando o pacto de segredo e silêncio que os participantes sustentam eu diria que coisas pesadas acontecem”, disse Lauany no vídeo.
O tema também virou alvo de piada. O comediante Saulo Pinheiro também publicou um vídeo na internet ironizando o movimento. “Tem que ser muito macho para enfrentar essas provas de resistência”, comentou Pinheiro.
O que diz a psicologia por trás do movimento:
De acordo com o psicólogo Gabriel França, de forma geral, o sentimento de pertencimento a grupos é algo humano, visto que isso se iniciou há 12 mil anos atrás, para a própria sobrevivência. Dessa forma, estar em grupo, mesmo que na atualidade, garante segurança, proteção e sentido de vida.
“Isso explica pra gente por que os seres humanos, isso obviamente não se restringe apenas aos homens, buscam tanto participar de grupos, estar em grupos e se aproximarem de pessoas que tenham interesses e motivações semelhantes às que eles próprios têm”.
Ao reunir um grande número de pessoas, segundo o psicólogo, é comum que cada indivíduo queira a aprovação dos demais. Dessa forma, movimentos como Legendários impactam a vida emocional dos participantes, dando a sensação de que eles estão “fazendo a coisa certa”, como se aproximar de Deus, tornar-se um homem de valor para ajudar a própria família, por exemplo.
“Penso que impacta muito emocionalmente esses homens, justamente por conseguir validar essas características que na sociedade atual que a gente vive não está tão bem delimitado. Se você perguntar para um homem, por exemplo, na rua, o que é ser um homem, você vai perceber que ele vai ter uma dificuldade muito grande de responder essa questão atualmente. Tanto porque a gente teve uma desconstrução do padrão do homem, então o homem da década de 60 não é mais a mesma coisa do que ser um homem em 2025”.
No entanto, para o psicólogo, movimentos como esse se assemelham aos movimentos coach. Com isso, os participantes podem ter mudanças em suas vidas, porém, a partir do momento em que deixam de fazer parte do núcleo do movimento, param de colocar em prática o que foi ensinado durante o período.
Vale ressaltar que alguns cuidados devem ser tomados pelos organizados quando são criados grupos que envolvem crenças e o estado emocional dos participantes. O psicólogo expõe que pessoas que buscam ajuda desse tipo de movimento, geralmente, estão mais fragilizadas.
Desta forma, é importante que se tenha um bom organizador, que entenda de comportamentos mentais, pois é muito mais fácil manipular os participantes quando eles não estão mentalmente fortes. Além disso, por ignorância do líder de um grupo, é capaz de piorar a saúde mental desse participante.
“Quando reunimos centenas de pessoas, como é o caso do grupo Legendários, vamos ter diversas histórias de vida, não conseguimos padronizar. Então, se o líder falar algo que possa ser um ‘gatilho’ para determinado participante, isso pode sensibilizar a pessoa”.
Outra questão levantada pelo psicólogo é a busca por uma solução imediata para problemas que, na verdade, deveriam ser tratados com o acompanhamento de um profissional. Ao falar no público masculino esse assunto é ainda mais presente. Visto que muitos tentam esgotar todas as opções antes de buscar uma ajuda.
As soluções rápidas encontradas nesses grupos podem reduzir o efeito emocional negativo, porém, como dito acima, segundo o psicólogo, não são efetivos para a melhora dos problemas.
“O indivíduo que está querendo participar do grupo talvez tenha um problema com a esposa, com as próprias emoções… vai lá, participa do grupo e, durante aquela experiência com o grupo, ele sente que aquela situação está resolvida e opta, por exemplo, por não buscar um psicólogo depois do grupo. Mas passando um mês esse mesmo problema vai ter uma tendência maior a voltar”.